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Direito, gestão e esportes

Direito, gestão e esportes

Segundo a legislação brasileira

Por Higor Maffei Bellini 

 

Nos termos do artigo 32 da Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé), é lícito ao atleta recusar-se a competir por entidade de prática desportiva quando seus salários, no todo ou em parte, estiverem atrasados por dois ou mais meses. 

Esse dispositivo consagra o direito de resistência do atleta diante do inadimplemento do clube, impedindo que a falta de pagamento gere qualquer consequência disciplinar ou contratual em seu desfavor.

Tal previsão foi mantida e reforçada pela Lei nº 14.597/2023 (Lei Geral do Esporte), cujo artigo 90, § 1º, dispõe que o atraso no pagamento da remuneração por dois meses ou mais autoriza o atleta a requerer a rescisão indireta do contrato de trabalho desportivo, com o recebimento de todas as verbas rescisórias devidas como se houvesse dispensa sem justa causa. 

A nova lei confirma o entendimento já consolidado no ordenamento jurídico desportivo: o atleta não está obrigado a competir quando o clube deixa de pagar o que lhe é devido.

Esse direito encontra paralelo na Consolidação das Leis do Trabalho (art. 483, “d”), que permite ao trabalhador considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando o empregador deixar de cumprir suas obrigações contratuais.

O salário é a principal contraprestação devida pelo empregador; sem ele, não há base jurídica para exigir a continuidade da prestação laboral.

O fundamento maior repousa também no princípio civil da “exceptio non adimpleti contractus”, pelo qual ninguém pode ser compelido a cumprir um contrato enquanto a outra parte permanece inadimplente.

Assim, o atleta que suspende suas atividades em razão do atraso salarial não comete falta, não pratica greve e não fere o contrato, mas apenas exerce legitimamente um direito conferido por lei.

Dessa forma, não pode o clube invocar prejuízo à imagem, abandono ou justa causa, seja em contrato de natureza trabalhista ou de prestação de serviços, pois o inadimplemento inicial é do próprio empregador.

Conclui-se, portanto, que a recusa do atleta em atuar diante do atraso salarial igual ou superior a dois meses constitui exercício regular de direito, plenamente amparado pela Lei Pelé, pela Lei Geral do Esporte, pela CLT e pelos princípios gerais do direito contratual, não podendo gerar qualquer punição ou prejuízo jurídico à atleta.