Por Higor Maffei Bellini
Eu tenho o orgulho de poder dizer que advoguei e se chamado advogarei de novo, para arbitros de basquete, que infelizimente foram agredidos, enquanto trabalhavam, apitando jogos sejam amistosos de categorias menores sejam campeonatos de veteramos, no Brasil.
Até por isso ministrei uma palestra, na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo, sobre o tema: https://www.oabsp.org.br/noticias/2015/11/oab-sp-promove-palestra-sobre-reparacao-de-danos-materiais-e-morais-sofridos-pelos-arbitros.10477
Após ler esta matéria "Árbitro é agredido por jogador durante partida de basquete; assista" https://www.uol.com.br/esporte/basquete/ultimas-noticias/2020/10/07/arbitro-e-agredido-por-jogador-durante-partida-de-basquete-assista.htm percebi que era hora de voltar a tratar do tema.
Você que nos acompanham a mais tempo, seja pelas entrevistas para as rádios, jornais ou pelas palestras realizadas, textos académicos ou em sites destinados a discussão e ensinamento de gestão ou de direito desportivo, vão lembrar o que eu sempre digo "as linhas de marcação de uma quadra ou campo desportivos, não impedem a aplicação das leis civis, e penais. Para ser aplicada apenas a lei desportiva".
Não discuto que dentro do âmbito esportivo, o atleta, membro de comissão técnica, dirigente de clube ou torcedor, que venham no local do jogo, ofender a integridade de um árbitro seja de forma cível, com ofensas a sua honra, a honra de seus familiares, ou a integridade física, com empurrões, cabeçadas, tapas no rosto devam sofrer as punições administrativas impostas pela justiça desportiva. Posto que pode e devem ser impostas.
Aqui vamos discutir brevemente a aplicação das leis brasileiras, de natureza civil e criminal ao agressor.
DO DEVER DE REPARAR O DANO MORAL
O que se deve buscar com uma ação cível é a condenação do agressor ou agressores, para que este efectue o pagamento de indenização pelo dano moral, causado ao árbitro, em razão das suas ações, ocorridas mesmo que dentro da quadra ou campo esportivo.
Isto porque o árbitro ou árbitra de qualquer modalidade sendo mais uma pessoa do povo, um cidadão, não pode passar por humilhação em seu local de trabalho, sendo invadido, seja por dirigente ou torcedor, para que ser agredido física e verbalmente, na frente de pessoas que estão ali para fazer o acompanhamento do trabalho do Autor, que para o bem o para mal faz parte do jogo que as pessoas foram assistir.
Todo dano, ocorrido no Brasil, ainda que seja exclusivamente moral é considerável como sendo indenizável pela nossa Carta Maior, bem como por nosso ordenamento cível, infraconstitucional no caso do Código Civil, como se observa pelas transcrições a seguir:
Constituição Federal
Art 5º
V – “È assegurado direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.
Código Civil
Art.186 – “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, ainda que exclusivamente moral, fica obrigado a reparar o dano”
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Os Doutos Professores, PABLO STOLZE e RODOLFO PAMPLONA[1], citando o sempre lembrado CLAYTON REIS, nos ensinam que o ofensor ao gerar o dano, deverá repará-lo, vejamos:
“...receberá a sanção correspondente consistente na repreensão social, tantas vezes quantas forem suas ações ilícitas, até conscientizar-se da obrigação em respeitar os direitos das pessoas. Os espíritos responsáveis possuem uma absoluta consciência do dever social, posto que, somente fazem aos outros o que querem que seja feito a eles próprios. Estas pessoas possuem exata noção de dever social, consistente em uma conduta emoldurada na ética e no respeito aos direitos alheios. Por seu turno, a repreensão contida na norma legal tem como pressuposto conduzir as pessoas a uma compreensão dos fundamentos que regem o equilíbrio social. Por isso, a lei possui um sentido tríplice: reparar, punir, educar.”
[1] Novo Curso de Direito Civil, Editora Saraiva, São Paulo 2005, pág.23,
Assim a ofensa praticada contra um árbitro esportivo, no Brasil é possível de gerar uma ação indenizatória de natureza civil. Ainda que a ofensa tenha sido apenas de cunho moral, como aquela que acontece com xingamentos, bem como pode gerar o dever de indenizar danos materiais como a reparação de veículos que venham a ser danificados.
Mas a ofensa pode ter repercussão penal, como abaixo explicamos:
O ordenamento penal Brasileiro, possui disposição específica que pode ser aplicada ao tema, como se pode ver pela transcrição abaixo:
Injúria
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa
Isto tudo em razão da DA IMAGEM DO ARBITRO que é ofendida tanto do ponto de vista cível, como criminal.
Toda pessoa, possui uma imagem, a qual pode ser dividida em duas partes, sendo a primeira a auto imagem da pessoa, aquela pela qual a pessoa se observa, em razão dos fatos e acontecimentos que ocorrem ao longo de sua vida, em razão do seu próprio trabalho e esforço. Bem como existe a segunda imagem que é aquela pela qual as pessoas observam a pessoa, é uma imagem, que a pessoa tem perante o meio social que a cerca.
No caso do árbitro sua imagem no meio que a cerca, que podemos chamar de imagem subjectiva, é entre os atletas, dirigentes e demais árbitros daquela comunidade, daquela modalidade esportiva.
E existe ainda a auto imagem, que podemos chamar de imagem objectiva é ainda mais elevada, uma vez que, o árbitro lembra de todos os sacrifícios que fez, para se formar e iniciar sua carreira, como árbitro, deixando o convívio de seus familiares, de aproveitar feriados, para fazer seu trabalho.
Assim a atitude de quem agride a um árbitro, fere a imagem do Autor perante a comunidade que o cerca, não apenas aquela presente no local dos fatos, mas também a aqueles que não estavam, mas que ficam sabendo da situação e prejudicando a auto imagem do árbitro, que se vê humilhado após todo o esforço pessoal, feito para chegar ao local que chegou, humilhação esta que continua quando outras pessoas perguntam agredido, o que ele fez para merecer a agressão, transferindo a culpa do ocorrido para o árbitro.
E não se pode permitir dizer que as ofensas fazem parte do trabalho do arbitro porque não fazem, ninguém trabalhar para ser ofendido. O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já se manifestou por vezes, sobre a configuração de danos morais, em razão de ofensas físicas e verbais, contra árbitros esportivos, ofendidos em razão do seu trabalho, vejamos:
0318832-96.2009.8.26.0000 Apelação Relator(a): Elliot Akel Comarca: Presidente Prudente Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 04/06/2013 Data de registro: 06/06/2013 Outros números: 6685014300
Ementa: RESPONSABILIDADE CIVIL DANO MORAL AGRESSÕES VERBAIS E FÍSICAS sofridas por ARBITRO DE FUTEBOL LESÕES CORPORAIS de natureza leve ato ilícito e dano moral comprovado SENTENÇA RATIFICADA, COM APLICAÇÃO DO ARTIGO 252 DO REGIMENTO INTERNO DO TJSP - RECURSO improvido
Estas são as nossas muito breves considerações sobre a responsabilidade civil e criminal, de quem ofende a integridade de um arbitro esportivo, poderemos no futuro voltar ao tema para falar sobre as provas, necessárias, para apresentar este processo à corte.